Leia a seguir um trecho do artigo Origem e memória das universidades medievais a preservação de uma instituição educacional, escrito por Terezinha Oliveira:
"Em fins do século XIX e início de XX, Hastings Rashdall estudou as origens da universidade medieval, publicando, em 1895, uma das principais obras dedicadas ao estudo dessa instituição. Segundo ele, a Idade Média teria nos legado instituições fundamentais e imperecíveis, entre as quais a universidade.
As instituições que a Idade Média nos legou são de um valor maior e mais imperecível do que suas catedrais. E a universidade é nitidamente uma instituição medieval – tanto quanto a monarquia constitucional, ou os parlamentos, ou o julgamento por meio do júri. As universidades e os produtos imediatos das suas atividades, pode ser afirmado, constituem a grande realização da Idade Média na esfera intelectual. Sua organização, suas tradições, seus estudos e seus exercícios influenciaram o progresso e o desenvolvimento intelectual da Europa mais poderosamente, ou (talvez deveria ser dito) mais exclusivamente, do que qualquer escola, com toda a probabilidade, jamais fará novamente.
Duas questões destacam-se nesta passagem em relação à formação de nossa sociedade. A primeira diz respeito à importância de instituições oriundas no medievo e que constituem a espinha dorsal da sociedade burguesa, como a monarquia constitucional, que durante séculos foi a forma de governo de nações européias e que subsiste ainda nos dias atuais. Outro exemplo de instituição medieval ainda existente é o júri, isto para não mencionarmos os bancos, os juros e a carta de crédito. A segunda é que o estudo das universidades medievais permite a compreensão do pensamento e do desenvolvimento das ciências na Europa. Inclusive, o autor afirma que nenhuma outra escola influenciou e influenciará o desenvolvimento do pensamento e das diversas áreas das ciências como a universidade medieval.
Em outra passagem, Rashdall salienta outro aspecto importante da Idade Média e das suas instituições:
A universidade, não menos do que a Igreja Romana e a hierarquia feudal encabeçada pelo Imperador Romano, representa uma tentativa de concretizar um ideal de vida em um dos seus aspectos. Ideais convertem-se em grandes forças históricas pela sua corporificação em instituições. O poder de corporificar seus ideais era o gênio peculiar do pensamento medieval, assim como seu defeito mais evidente assenta-se na correspondente tendência para materializá-los (...) Nossa atenção estará voltada em sua maior parte confinada às primeiras e típicas universidades (...) quando nós comparamos Bolonha com Paris e Paris com Oxford e Praga, verificamos que as universidades de todos os países e de todas as épocas são, na realidade, adaptações, sob várias condições, de uma e mesma instituição.
Ao afirmar que as universidades corporificam os ideais dos homens medievais, Rashdall alerta-nos para o fato de o medievo ser cheio de movimento e vitalidade. Os homens dessa época, como os de qualquer outra, erigiram suas instituições para responder às questões que se colocavam, ou seja, materializaram seus ideais em instituições para produzirem suas vidas e traçarem seus caminhos.
O importante nesse processo de materialização de suas idéias é que elas foram tão reais e corresponderam, significativamente, aos interesses dos homens e que muitas prevalecem ainda hoje. Vivemos em e vivenciamos instituições cuja existência data de mais de oito séculos, como a universidade. Acerca da importância e função das instituições humanas, lembremos Guizot, que afirma que as instituições e leis humanas são criadas para responder necessidades de uma determinada época e sobrevivem enquanto as mesmas responderem a essas necessidades e expectativas. Assim, se elas sobrevivem até os nossos dias é porque correspondem ainda a determinadas exigências da vida humana. Dito de outra maneira, ela ainda possuem vitalidade."
(OLIVEIRA, Terezinha. Origem e memória das universidades medievais a preservação de uma instituição educacional. Revista Varia História Varia hist. v.23 n.37 Belo Horizonte jan./jun. 2007.)